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SANEAMENTO: Menos de 40% dos moradores do Nordeste possuem esgoto tratado, alerta Trata Brasil
Vida Urbana
Publicado em 30/07/2019

Situação mais crítica está no Piauí (10,24%) e no Maranhão (11,56%), onde apenas uma em cada dez residências estão ligadas a redes de coleta de esgoto

    • A região Nordeste possui apenas 34,73% do esgoto tratado. É a segunda região com o pior índice, segundo dados divulgados este mês pelo Instituto Trata Brasil e referentes ao ano de 2017. A situação mais crítica está no Piauí (10,24%) e no Maranhão (11,56%), onde apenas uma em cada dez residências estão ligadas a redes de coleta de esgoto.

Apesar de terem uma cobertura maior, os outros estados do Nordeste ainda oferecem serviços coleta de esgoto a menos da metade de seus moradores. A maior cobertura é ofertada na Bahia (37,56%), abaixo do considerado satisfatório (70%)

Segundo especialistas, a falta de investimentos em saneamento básico ainda é o principal problema a ser enfrentado. Na avaliação da doutora em saneamento básico e professora da Universidade Federal do Alagoas, Nélia Henriques Calado, a concessão dos serviços é uma saída viável para os municípios.

“As parcerias público-privadas são muito bem-vindas e têm atuado de uma forma muito positiva por contribuir para a melhoria da qualidade de vida das cidades”, afirma.

Os números oficiais comprovam que a precariedade do setor tem reflexo na saúde de adultos e crianças brasileiras. Segundo o IBGE, entre 2016 e 2017, 1.935 dos 5.570 municípios (34,7%) registraram epidemias ou endemias ligadas à falta de saneamento básico, como casos de diarreia, leptospirose, cólera, malária e hepatite.

A evolução dos serviços, por outro lado, equivale à economia nos cofres públicos. Estimativa do Trata Brasil, com base em dados do IBGE, calcula que as despesas com internações por infecções gastrointestinais no SUS podem cair de R$ 95 milhões (2015) para R$ 72 milhões em 2035.

Para o presidente do Instituto Movimento Cidades Inteligentes, Luigi Longo, as parcerias público-privadas, conhecidas como PPPs, podem aperfeiçoar a qualidade do saneamento ofertado.

“Há parcerias público-privadas por meio das quais a água ou a concessão dela é do setor público e, na mesma cidade, o esgoto é do setor privado. Isso ocorre porque o setor privado consegue tratar melhor o esgoto, enquanto a distribuição da água é do município ou do estado, por exemplo. O que eu entendo é que não existe a viabilidade total nem no setor público, nem no privado, mas a junção deles em um objetivo comum”, analisa Luigi.

Atraso

Nos últimos três anos, o Brasil reduziu os investimentos em saneamento básico, segundo o Trata Brasil. Em 2017, os recursos aplicados no setor foram R$ 1,28 bilhão menores do que em 2015. O retrocesso é ainda mais nítido quando se observa que o valor investido em 2017 foi o mesmo de 2011 (R$ 10,9 bilhões). Das 100 maiores cidades do país analisadas no levantamento, 70 reinvestiram menos de 30% do que arrecadaram.

De acordo com a Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon), os dados reforçam a necessidade de investimentos no Brasil. Um dos caminhos, segundo a entidade, seria avançar na regulação do setor com a ajuda de investidores privados.

“Quanto mais a gente puder, por meio de parceria com o setor privado, desobrigar o recurso público de um serviço ou um investimento que pode ser feito com recurso privado, mais fácil será para acelerar investimento. Isso permite também que estados e municípios possam realocar esse recurso em áreas como saúde, educação e segurança”, afirma o diretor de Relações Institucionais da Abcon, Percy Soares Neto.

Marco regulatório

O governo federal editou uma medida provisória (MP 868/2019) com o objetivo de criar novas regras para o setor de saneamento básico no país. No entanto, o texto perdeu a validade no início de junho. As propostas incluídas na MP, que foram debatidas em comissão mista do Congresso Nacional, encorpam o PL 3235/2019, de autoria dos deputados federais Evair de Melo (PP-ES) e Felipe Rigoni (PSB-ES).

A principal mudança sugerida na legislação é quanto ao modelo de exploração dos serviços. O foco é na concessão, semelhante ao que ocorre atualmente com os aeroportos brasileiros. Dessa forma, os municípios serão obrigados a abrir licitações para escolher o melhor prestador de serviços, que poderão ser executados por empresas públicas ou privadas. Hoje, o mais comum é que as prefeituras firmem contrato de gestão, por exemplo, com a companhia estadual de água e esgoto, embora 325 municípios já tenham firmado contratos com a iniciativa privada no país.

Para o senador Tasso Jereissaiti (PSDB-CE), que foi relator da MP do Saneamento na comissão mista do Congresso, o novo marco regulatório deve ter como principal foco melhorar os serviços ofertados aos brasileiros. “É necessário mudar. Deixar como está é um crime”, avalia.

O deputado Hildo Rocha, do MDB do Maranhão, comparou a situação dos brasileiros que vivem sem saneamento à dos habitantes da África do Sul, em 1948, que tiveram os direitos cerceados pela minoria branca que estava no poder.

“[O objetivo do PL é] permitir que a população mais pobre deixe de participar do apartheid e passe a ter água tratada nas suas residências”, comparou.

A redação do PL 3235/19 prevê ainda que a Agência Nacional de Águas (ANA) passe a ter a função de estabelecer normas de referência para a regulação dos serviços de saneamento básico. Essas normas devem “estimular a livre concorrência, a competitividade, a eficiência e a sustentabilidade econômica na prestação dos serviços”, além de “buscar a universalização e a modicidade tarifária”.

A proposta está apensada ao PL 3261/2019, que já foi aprovado pelo Senado. Após o recesso parlamentar, o texto passa por análise da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados.

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