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Projeto limita dispositivo judicial que aciona patrimônio particular de sócios de empresas e sociedades limitadas
Justiça
Publicado em 27/06/2019

Para especialista, proposta corrige uso “banalizado” da chamada desconsideração da pessoa jurídica. Esse instituto é usado pela Justiça em cobranças de dívidas sobre patrimônio particular de empresários.

As regras de separação patrimonial entre as sociedades empresariais e seus sócios podem ficar mais claras no país. Em tramitação na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei 3243/2019 propõe limitar as hipóteses na aplicação da chamada desconsideração da personalidade jurídica.

Esse instituto permite que o patrimônio particular de sócios de empresas seja atingido para o pagamento de dívidas, na hipótese de fraudes ou de abuso de direto por parte das firmas.

No entanto, na avaliação de juristas ouvidos pela reportagem, a utilização do dispositivo jurídico tem se tornado comum nos tribunais não apenas nos casos previstos em lei, mas também quando as empresas não conseguem honrar suas dívidas por insuficiência de recursos.

Para o autor da proposta, deputado federal Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PSL-SP), o projeto busca estimular a abertura de novos negócios e dar mais segurança jurídica ao proteger o empreendedor.

Ele acredita que as mudanças garantem mais liberdade nas relações econômicas e criam regras claras para a Justiça diferenciar as responsabilidades da pessoa jurídica – a empresa – e da pessoa física – os sócios.

“Com essa medida, a Justiça desvincula. Se você investiu mil reais em um investimento, os seus mil reais são o que você tem a perder”, explica Orleans e Bragança.

Na visão da especialista em Direito Empresarial, Ana Carolina Osório, quando a desconsideração da pessoa jurídica é aplicada sem obedecer o critério principal de coibir fraudes empresariais, a medida “se desvirtua por completo”.

“A Justiça do Trabalho e as Varas de Fazenda Pública, em processos de execução fiscal, em processos envolvendo relação entra empregado e empregador, têm banalizado esse instituto. Basta que a empresa não tenha patrimônio para pagar seu credor, e esse credor pode alcançar o patrimônio do sócio”, completa a jurista.

Entendimento

O uso livre da desconsideração da personalidade jurídica em ações de cobranças na Justiça, de todo o tipo e circunstâncias, elimina a “fronteira” que divide aquilo que é da empresa daquilo que é particular, causando insegurança para os empreendedores, travando novos investimentos e a criação de vagas de emprego no país.

Por isso, o texto do projeto prevê alterações no Código Tributário Nacional (CTN), a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e o Código de Defesa do Consumidor (CDC) para normatizar o uso da desconsideração da personalidade jurídica.

De acordo com o projeto, os juízes só poderão usar o dispositivo após a comprovação de abuso de direito, excesso de poder, infração de leis, de violação de estatuto ou contrato social das empresas, e diante de ato ilícito dos sócios.

“Se essa sociedade contrata, por exemplo, um empréstimo junto a um determinado banco, quem responderá no vencimento por esse empréstimo é a sociedade. Se a sociedade, eventualmente, não pagar o que é devido, o banco judicialmente vai promover as ações cabíveis”, explica Marcelo Cometti, especialista em Direito Empresarial da Escola Brasileira de Direito (Ebradi).

Cometti esclarece que “se, eventualmente, aquela sociedade não tiver no seu patrimônio bens suficientes para satisfazer o banco, então, nesse caso, aquele valor que o banco não recebeu por regra é prejuízo do banco”. “Eu não posso, como regra, buscar a satisfação desse valor não pago pela sociedade junto ao patrimônio dos sócios”, completa.

Apresentado no fim de maio, o PL 3243/2019 aguarda para ser encaminhado às comissões da Câmara dos Deputados.

Liberdade Econômica

Em 30 de abril, o governo federal publicou a Medida Provisória 881/2019, conhecida como MP da Liberdade Econômica, que também normatiza o uso da desconsideração da pessoa jurídica, em ações na Justiça.

O texto da medida altera o Código Civil e deixa claro que o patrimônio da empresa responderá pelas dívidas da sociedade e não poderá se confundir com os bens dos sócios, em nenhuma hipótese.

A MP, que está em vigor, autoriza o Judiciário usar o instituto apenas em casos comprovados de fraudes dolosas, com intenção dos sócios de praticar delitos em benefício próprio e contra credores. A Justiça poderá bloquear os bens particulares dos empresários apenas se comprovados atos de desvio de finalidade empresarial da sociedade ou confusão patrimonial entre sócios e empresas.

A medida é analisada em Comissão Mista do Congresso Nacional. O presidente da comissão é o senador Dário Berger (MDB-SC) e o relator do texto é o deputado Jerônimo Goergen (PP-RS).

A previsão é de que o relatório de Goergen seja votado na comissão até o dia 3 de julho. Em seguida, a MP segue para aprovação nos plenários da Câmara e do Senado para continuar a valer.

 

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